terça-feira, novembro 23, 2004

A festa foi muito boa.

Meus pedaços foram muito bem recebidos. Tratavam-se de fitas. Fitas brancas de cetim com trechos de poemas que tirei de livros de poesia e prosa de alguns dos meus escritores preferidos. Cada pessoa que chegava colocava a mão dentro de um saco e tirava uma na sorte. Depois, amarrava nela mesma. Foi legal, as pessoas receberam bem. Alguns trechos que eu usei:

...quero apenas contar-te a minha ternura...
...tudo que existe em mim de grave e carinhoso...
...eu quero um punhado de estrelas maduras...
...todas as manhãs o aeroporto em frente me dá lições de partir...
...tudo o que amamos são pedaços vivos do nosso próprio ser...
e por aí vai...

Fiz muitas fotos das fitas pela cidade. Levei elas (cerca de 60 metros) aos meus lugares, lugares importantes pra mim. Lugares por onde eu passo, onde trabalho, onde moro... Esta parte me consumiu muito tempo e energia. Andei pra cima e pra baixo com as fitas e uma câmera bem pesadinha dentro da bolsa. Foi uma experiência bem interessante. Acabei criando uma relação importante com as fitas. Cheguei a não querer me desfazer delas por alguns momentos. Acho que atingi meu objetivo. Elas assumiram realmente o papel de pedaços de mim. E nunca é fácil entregar pedaços de si, nunca é fácil se entregar.

Durante a festa estas fotos ficaram coladas na parede, pra que as pessoas vissem a história daquelas fitas antes de chegar às suas mãos. E a gente sempre chega até as pessoas carregando uma história, nunca em branco.

Agora fico pensando que destino estes pedaços de mim terão, cada um seguindo o seu caminho. Mas as coisas são assim mesmo, a gente se entrega, se expõe e logo em seguida perde completamente o domínio sobre o que o outro vai fazer com isso. É essa a idéia mesmo.

Fiz fotos durante a festa. Fotos das pessoas comigo, das pessoas com as fitas... Registrei até o último momento a história destes pedaços de mim enquanto estavam perto de mim ainda, antes de seguirem seus próprios caminhos.

No outro dia, fui ao show do Vitor Ramil no Teatro São Pedro. Foi o máximo. Cantei todas as músicas que sabia e até chorei durante as que me tocam mais. Depois do show, falei com ele e entreguei uma fita. Provavelmente ele não tenha entendido muita coisa, mas foi muito atencioso. Pegou a fita, leu, sorriu, agradeceu e me deu um beijo no rosto. Depois, guardou a fita no bolso, eu vi.

Acho que isso é o máximo de atenção e carinho que uma pessoa poderia mostrar nesta situação. Fiquei feliz. Foi bom ver que o cara que escreve coisas que me tocam tanto trata as pessoas assim, olhando no olho e se doando, de um certo modo. Me pareceu muito sincero. Ele poderia ser um baita músico e poeta, mas ser um merda no trato com as pessoas. Não é. Não foi.
Só me arrependo mortalmente por não ter tirado uma foto dele (com a fita, claro), dado que as fitas e as fotos fazem parte de uma história maior e tal. O que aconteceu foi que eu não quis parecer ridícula, dar de tiete... Por outro lado, não diria que ele me achou uma gênia só por não ter tirado fotos...

Me sobraram algumas fitas, que vou continuar dando às pessoas que não puderam ir à festa. Uma delas peguei pra mim, e estou usando. Estava, pelo menos, no dia do show.

Pretendo colocar todas as fotos que resultaram deste processo na internet, pra que as pessoas possam ver. Vai faltar a foto do Vitor Ramil, mas paciência...

No mais, aguardem notícias das fitas...